Risco de manipulação de jogos na Copa do Mundo é real, afirmam especialistas

 

A manipulação de resultados é um risco real para a Copa do Mundo de 2018, na Rússia. Essa é a opinião de especialistas consultados. Para garantir a integridade do megaevento e impedir esse tipo de delito, a Fifa colocará em prática uma série de medidas preventivas nas próximas semanas e durante a competição.

Proteger competições da ameaça de manipulação de resultados é fundamental para a Fifa. Para garantir que a integridade da Copa do Mundo 2018 não será comprometida de qualquer forma, a Fifa, em colaboração com seus parceiros, implementou uma série de medidas específicas para proativamente prever, detectar e responder a qualquer atividade suspeita e/ou qualquer tentativa de se manipular um jogo da Copa – confirmou a entidade, por meio de um porta-voz.

O alerta já está ligado com os amistosos preparatórios antes da Copa. Regulada parcialmente, a organização desses jogos é de responsabilidade das federações. Até a abertura do Mundial haverá treinamentos com as 32 seleções. Os workshops serão mais focados nos jogadores e nos árbitros, mas também atenderá aos treinadores e dirigentes.

Um ponto particular será a análise simultânea dos mercados de apostas online e as ações em campo durante cada um dos 64 jogos da Copa do Mundo. Para esse serviço a Fifa tem a parceria da Sportradar, empresa presente em mais de 30 países e especializada no mercado de apostas esportivas, que também atende à NBA e à NFL.

Por se tratar de um ramo da indústria do crime, é difícil precisar quanto dinheiro a manipulação de resultados movimenta no mundo. O volume de apostas esportivas levanta cerca de € 1,4 trilhão por ano. Estima-se que a corrupção de partidas de futebol gere € 3,2 bilhões por ano. Como comparação: a Fifa teve uma receita bruta de aproximadamente € 3,5 bilhões na última Copa do Mundo, de 2014.

Levando-se em conta esse percentual de fraudes, o monitoramento ostensivo e a audiência global de mais de 3 bilhões de pessoas, a possibilidade de manipulação de uma partida da próxima Copa do Mundo é considerada pequena. Mas ela existe. Especialistas afirmam que o tamanho das cifras e a quantidade de transações dificultam a detecção de corrupção, que pode ser escondida em múltiplas apostas. Além disso, a partir do momento em que as seleções não estão mais no páreo, ficam mais vulneráveis à abordagem do crime organizado.

Não dá para dizer que um jogo de Copa do Mundo nunca será manipulado. O mercado “in-play” (apostas durante a partida) oferece uma oportunidade. Jogadores podem ser influenciados para dar um escanteio ou tomar um cartão em retorno por dinheiro, já que essas ações podem não afetar diretamente o resultado do jogo – comentou Andy Brown, do “Sports Integrity Initiative”, veículo internacional especializado em questões que afetam a integridade do esporte.

“A Fifa e a Uefa precisam ser mais proativas nas regras sobre que informações as federações podem comercializar. Elas sabem que, em certos casos, associações inteiras são controladas por corruptos”, disse Andy Brown

A questão ganha outros contornos em 2018 porque a Copa será na Rússia, país com histórico de suspeitas de corrupção em competições locais. Pelo menos US$ 1 bilhão é injetado por ano por empresas do país no exterior, na indústria ilegal de apostas online. A estimativa das autoridades russas é de que jogos de azar na internet movimentem US$ 7,8 bilhões/ano no mercado ilegal. Na tentativa de diminuir o problema, a Rússia lançou em 2016 a “TsUPIS”, plataforma de apostas autorizada pelo governo. Ainda naquele ano, a Europol desmontou uma quadrilha transnacional composta por membros da máfia russa, que lavava dinheiro ao assumir clubes de futebol em crise financeira em Portugal. Eles faziam isso para lavar dinheiro com a manipulação de resultados.

Haverá um aumento tanto de apostas legais quanto ilegais durante a Copa do Mundo, como já ficou evidente em outras grandes competições. Apostadores podem viajar para a Rússia na tentativa de manipular os jogos e obter vantagens nas apostas, mas as autoridade russas e as entidades internacionais de segurança terão um intenso esquema de segurança e de inteligência para garantir a integridade da Copa – comentou Fred Lord, diretor da área Anti-Corrupção e de Transparência do Centro Internacional de Segurança no Esporte (ICSS, em inglês).

“A manipulação de resultados e a corrupção no futebol são e sempre serão uma ameaça se os governos falharem em regular efetivamente a indústria da aposta no esporte”, disse Fred Lord.

Um jogo fraudado das Eliminatórias Africanas para a Copa do Mundo de 2018, entre África do Sul e Senegal. Nessa partida, ocorrida em novembro de 2016, o árbitro ganês Joseph Lamptey marcou pênalti num lance em que a bola claramente não pegou na mão do jogador, que influenciou no placar final.

A Fifa decidiu banir o árbitro para sempre do futebol e remarcou o jogo. Segundo relatório enviado pela Sportradar para a Fifa, as evidências indicavam que apostadores sabiam que pelo menos três gols ocorreriam naquele jogo (placar final foi 2 a 1).

Em 2014, o então chefe de Segurança da Fifa, Ralf Mutschke, denunciou a tentativa de assédio de árbitros e jogadores por parte de criminosos que tentavam comprar e manipular resultados na Copa do Mundo, no Brasil. Mutschke deixou o cargo no fim de 2016.

A identificação de casos de manipulação se dá na análise do volume das apostas, junto da observação de algo suspeito dentro de campo, como a marcação de um pênalti inexistente, expulsões em excesso etc. Esse tipo de crime está atrelado principalmente ao mundo de apostas online. Jogadores, árbitros, técnicos, dirigentes, clubes, seleções e confederações são alvos em potencial. Os motivos podem ser esportivos ou econômicos.